Isabel Mendes Ferreira, por vezes
eu a escrevo Isa, e por outras a reverencio com o seu nome completo: Isabel.
Doce Isa, Isabel do tempo, “o
tempo é renda” como lembra a escritora, aqui no Brasil sua escrita deveria ser
cantada aos quatro ventos, pois nasce, desenvolve, transcende, morre, transmuta
inspiração.
Poderia tentar descrever a
autora, como e em que grau a conheço, mas isso é pouco, pois Isabel Mendes
Ferreira é das melhores escritoras de Portugal, em nossa atualidade. O
privilégio e alegria de receber em casa, um dos últimos exemplares da edição de
2010 “As Lágrimas Estão Todas na Garganta do Mar”, pela editora Babel, me fez
ter vários momentos. A já mencionada alegria, que se seguiu de surpresa,
encantamento (aí os sentimentos e alhures que os textos geraram a este leitor:
raiva, angústia, alegria, candura, drama, tragédia, pressa, ressalva,
pertencimento a humanidade e tanto o mais que nos torna humanos), deslumbre e
novamente a alegria, mas desta vez já transformada pelo livro. Sim, para quem me
lê, o livro (talvez qualquer um) transforma o leitor, mas não da maneira usual,
e sim, especial, uma transmutação se dá (se deu), a alegria agora tinha o tempo
e matizes de uma sonoridade sem mar.
A escritora mostra ao leitor,
como é possível ser original, em meio a tantas naus naufragadas, em ritmos e
marcações, que seguram ou desviam o fluxo natural da palavra. Habilidosa
rendeira de palavras, como as rendeiras nas praias nordestinas brasileiras, ela
tece, prestimosa, os fios numa fina renda de verbos que saltam alegres e
tristes. Tudo tem vida. Deve-se retornar ao livro, sem pressa, sem ordem, com o
caos que ela consegue organizar, com o fio do tempo.
A originalidade na construção de
suas frases nos leva da prosa ao verso. São cerca de 400 páginas de pura magia que
não se pode atrelar a qualquer tipo de construção que exista. Ela é única.
Fiquei preso a trama da renda do tempo. Sou outro agora. Depois dela. De seu
livro. Percebo o tempo. Sou dele e nele me transformo. O tempo.
Rebelde, ácida, leve, maternal
sem filho, é tudo isso e mais.
“o mundo cá dentro e o silêncio lá fora
horas que tardam na sangria do tempo
foram os teus sinais de espada que me deram o nó.
na dissoluta e aérea boca do tempo deslacei a carta...
...sem domínios. dominós de ais. como poros. ou ravinas."
Ferreira, Isabel M. pg. 187
Não se consegue desgrudar do
livro, sempre se quer ir mais e mais pra dentro, pro fundo das “Lágrimas Estão
Todas na Garganta do Mar”. Vá só. É uma viagem segura, em que o máximo que pode
acontecer é encontrares a ti, nos teares da escritora.