Há algo de estranho,
Sim, há algo de estranho!
Virar a cabeça e não conseguir ver nada
Aguçar o ouvido e não ouvir patavina.
Os sentidos embriagados por barbitúricos e álcool,
Álcool e mais barbitúricos,
Há algo de estranho quando tenta se aliviar com cortes
Navalha afiada, pele desfiada.
Há alivio na dor do profundo?
Os sentidos desaparecem,
A brasa do cigarro já queimou a face
Relance de uma cicatriz, marca ao mundo.
Há algo de estranho,
Não, não há, ou há?
Álcool, mais álcool, mais cortes
Mais cicatrizes futuras.
Defunto ainda vivo com urubus ao ar,
A foto do porta-retrato rasgada,
A janela escancarada do sétimo andar
Ninguém para telefonar.
Sim, algo perece junto aos sentidos,
Não se ouve, vê, sente, degusta ou cheira
Só a cor do sangue pisado, coagulado
Dos cortes e das queimaduras.
Ninguém para lhe ouvir, tudo quieto,
Os gatos com comida para meses
E as reses vão para o abate, sem sentir
Há algo de estranho em que se joga do sétimo andar?
Cristiano Melo, 21 de Novembro de 2009.