domingo, 31 de maio de 2009

Revolução


Olhos serrados,
Acordado que caminha,
Sonambulismo furtivo.

Criar arte em ação
Foge ao padrão
Estáticos rancores.

Transformar letras
Em frases multicores
Devolve o logro fenestrado.

Abramos os olhos
Com a coragem dos fortes
Dos antepassados queimados.

Façamos nossa revolução
Também deles a justiça
Despertar os dormentes

Numa humanidade de dementes
Acreditar na transformação
Viver longe da escuridão.

Cristiano Melo, 31 de maio de 2009.

O OUTRO



Foi quando olhou para a figura na sombra do beco próximo, que viu o inusitado. Com a mão cobrindo o raio de sol, e apertando a vista, sem acreditar no que via, percebeu que havia um homem que olhava para ele, e o não acreditar vinha da percepção de que aquele ser era parecido com ele. Voltou-se para o beco e caminhou mais um pouco, devagar, atordoado com a situação que se aproximava, ele sentia. O outro também fez o mesmo, na mesma velocidade. Olhares sem palavras, pois daria para se ouvir um ao outro no espaço que os separava, continuavam curiosos, sim o outro também expressava surpresa, a analisar as feições de cada qual. O outro ainda estava no escuro e o homem não teve a coragem de entrar no beco, e, já estavam a dois metros um do outro. A boca tremeu, ao tentar balbuciar alguma coisa como um bom dia, ou qualquer introdução de si, nada, nem um som, só lábios trêmulos. Ficaram assim, inertes, espasmos visíveis nos braços e pernas, fugir ou enfrentar o que viria logo em seguida, sim ele sentia que algo estava para acontecer, e o outro parecia sentir o mesmo, pois não sabia onde por as mãos e nem conseguia voltar de onde saíra, do beco escuro.

O sol brilhou mais esquentando a pele do homem, um certo incomodo, o calor que começava a lhe brotar gotas de suor pela testa, e o receio de encarar o lado escuro daquela rua. Mas não podia fazer mais nada e já se passara mais de duas horas naquela situação. Foi quando conseguiu, com tremendo esforço, articular palavras. E o que se ouviu foi uma espécie de choro, palavras chorosas.
“Quem é você?”, foi o que saiu de sua boca. “Não sabe?”, a resposta no mesmo tom. “N-não... Deveria?”, e quase fugiu nesse momento com o temor que crescia. “Talvez devesse saber, pois eu sei quem é você, só não esperava vê-lo tão cedo”, o outro retrucou já com uma voz mais firme e um olhar mais penetrante. “D-desconfio que eu saiba, mas estou confuso, como isso pode acontecer? Eu só estava indo pro trabalho...”, e entrou na sombra do beco, a um passo de seu interlocutor. “Não existem respostas fáceis, na verdade não existe nada que eu saiba que você também não saiba!”. O corpo todo ensopado de suor, mas não devido ao calor e sim pelo medo que começava a imobilizá-lo, “como assim? Você é alguma espécie de mágico ou vidente?”. “Não, nada disso, e compreendo a sua ignorância, fantasiei até que você nunca me descobrisse, pois poderia continuar no meu lugar”. “Mas o que eu tenho a ver com o fato de você sair de seu lugar?”, perguntou o homem já um pouco mais tranquilo, afinal o seu interlocutor era muito parecido com ele fisicamente, e isso que o havia deixado curioso e com medo, agora cedia a uma sensação de segurança. “Ora, meu caro, não percebe como temos os mesmo olhos, o mesmo corpo?”. “Sim percebi desde o inicio”. “Pois, eu sou você, e sei que não sabia de minha existência. Sei também que algumas vezes me percebeu, mas nunca como agora. Já chegou a me ver em diversos momentos, mas nunca parou para trocar palavra, e confesso que não era para isso acontecer. Agora sou eu que estou confuso”, estavam quase abraçados nesse momento. “Então você é o meu eu profundo? O lado da escuridão que pensei não ter?!”, “sim, talvez possa chamar assim”, e levou a mão ao ombro do homem. “Mas isso é algo bom, não?!”, retrucou ao olhar que a mão tinha pelos. “Depende! Muito embora agora que nos encontramos, não há mais retorno, e se isto é bom ou ruim, são valores agregados de sua cultura e moral”. “Não há que se empregar valor nesse tipo de encontro”, e levou a outra mão peluda ao outro ombro. “Certo, sem agregar valor... Isso eu aceito e compreendo, mas o que acontecerá agora?”, perguntou enquanto fez o mesmo, só que com as duas mãos de uma vez, os dois quase abraçados, separados por braços. “Não sei, mas saberemos, não há como voltar atrás...”, e suas reticências foram interrompidas por uma leve luz sonora que veio dos respectivos corações. Inicialmente tênue depois cada vez mais forte. Dois corpos que se fundiram. Um ser foi constituído, de dois seres que eram o mesmo.

Transformação concluída e o homem, com um olhar confiante, saiu do beco para o mundo.

Cristiano Melo, 31 de Maio de 2009.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Eles e a furia

ELE E ELA
Entrava em seu condominio pela porta de vidro temperado quando ouviu uma voz ao longe gritar seu nome, dava para perceber que era uma voz conhecida, mas de longe parecia apenas um megafone estridente que lhe chamava. “Terêncio!”, repetia a voz enquanto buscava em meio aos transeuntes identificar quem o chamava. Logo as mãos que agitavam ao vento fizeram-no reconhecer Maria, sua ex-alguma-coisa. Havia três anos de separados sendo uns dois que não se falavam, esquisito que foi a separação, já que ele achava se tratar de um golpe do baú, uma vez que ela era a empregada da casa de seus pais, e, trazia pelo braço, um garoto de uns dois anos de idade. Pensou rápido: “caralho só faltava essa agora, ser pai”. Não esperou para saber, virou as costas e entrou no prédio.

NÓS
Foi sua voz que me confortou ao telefone, quando tive medo. Receio de que tudo aquilo pudesse ser uma fantasia desvairada carnavalesca de férias de verão, apesar dos dois anos de caso. “Mas e se...” repetia ansioso como se o que viesse dela pudesse me confortar, e confortava. Sua voz era atenciosa e via seu lindo sorriso rasgar a comissura labial, com aquela covinha no canto da face, em pensamento, pois não era videofone e sim um aparelho telefonico com fio, de uma central telefonica residencial. “Mas como é que...” indagava choroso àquela oitava maravilha enfeitada de efeitos e tons estrelares. Sua prestimosa atenção me embalava e afastava do temor que me crescia no peito. “Mas se ele...” interrompido que fui ao ouvir um estalo do outro lado da linha, um soluço preso à garganta me deixou sem palavras, e um gemido ecoou ao meu ouvido, “ele a matou!”. Meu receio cedeu ao pavor da certeza: as reticencias se tornaram exclamação! Não pude nem sequer ligar para a polícia ou a uma ambulancia, pois ele, o marido enciumado, já aparecia do quarto de minha patroa e descarregava mais três tiros de seu tresoitão. “Morre também seu desgraçado! Se tivesse mais bala ainda matava aquele menino lá de baixo junto com aquela vaca da Maria...”. Apontou para a têmpora e apertou o gatilho uma vez mais.

ELES
Assustados com o barulho dos tiros, porteiro, Maria, seu sobrinho de dois anos, alguns moradores subiram ao apartamento de Terêncio. Bateram à porta e só ouviram mais um estampido e silêncio. Maria, a ex-alguma-coisa, ainda perplexa, pois não esperava ver Terêncio depois de dois anos, e nem queria saber onde ele morava, de tanta humilhação que ele a fez passar, muito menos presenciar aquela tragédia. Chorosa, tentou explicar ao filho de seu irmão porque seu pai estava morto na primeira vez que ela o levara para conhecer seu local de trabalho.

Cristiano Melo, 15 de Dezembro de 2008.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Água de Pia


-Pra mim?!
Perguntou Carol ao homem com quem acabara de trepar, após pedir um copo com água. Por estar numa quitinete de uns vinte metros quadrados, havia achado estranho o fato de ele ter servido água da pia, deixado o copo lá mesmo e voltado a deitar no sofá-cama, único objeto além da pia e de uma pequena estante com um filtro de água em cima.
-É...
Respondia Caetano num bocejo de quem acabara de ejacular suas vontades. Por estar em sua moradia, não se importava em ser o que era, transparente que fora ao não comunicá-la que ela era gostosa, e só.
-Já vou, tá?!
Carol, com o copo na mão, dirigiu-se a porta para sair, havia achado uma falta de educação insuportável, ter dado para aquele bosta indolente e ele lhe servir aquilo, quem ele pensava que era, mordiscou em seus pensamentos.
-Já?!
Com algo da tirana culpa penitente ocidental, não sabia ao certo porque relutara em deixá-la ir embora, ela já começava a fazer expressões estranhas na face e poderia haver alguma conversa, o que ele não queria de forma alguma, ela era gostosa, e só.
-É que tenho de dar água e comida aos meus gatos...
Respondeu sem entender porque simplesmente não saía correndo daquele local sujo e deprimente, ela que tinha uma cobertura com piscina e gatos.
-Sei, os gatos são mais importantes que...
-Você?
-É.
-Mas são
-Quem?
-Os gatos...
-O que?
-Os meus gatos são mais importantes que você!
-Ah...
Ele titubeava e queria que ela fosse embora, mas movido por qualquer coisa que não conseguira identificar, tentava demonstrar que não era um cara que só trepara com ela, sentia-se diferente dos outros, mas ela era gostosa!
-Tchau, você me liga?
Pronto, lá vinha o compromisso, pensava Caetano, que logo, deitado que estava, fechara os olhos e dissimulara leve adormecer.
-Ei!
Carol, ainda segurando o copo com a água da pia, chamou a atenção dele, que já ensaiou um pequeno ronco e não se mexeu.
Ela abriu a porta, o copo apertado entre os dedos, saiu com os olhos arregalados de raiva e desprezo. Ele continuou no seu intento de dormir.
Ela foi embora.
Ele ficara.
Bebeu a água enquanto descia as escadas que rangiam, como seus dentes, da ira despertada. A água não desceu junto com ela, e saltou numa cuspida direto ao chão, jatos de vômito a acompanharam, e Carol escorregou em seu próprio regurgito, caiu, e, antes de quebrar o pescoço, lembrou: quem vai dar água a meus gatos?

Cristiano Melo, 25 de Junho de 2008.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Temor

Temer o fim do amor que lhe arrouba o afeto
Nada traz à sua liberdade de concreto.

Temer a dor na carne lancinante
Não aplaca a sensação perpetrante.

Temer a despedida impregnavel da lágrima jocosa
Não limpa a saudade por si consutosa.

Temer a morte do ser querido
Não a afastará do ato consumado.

Temer o passado e o futuro
Não traz paz ao presente.

Se à propria sorte lhe é reservado a morte,
Não há consistência no temer!


Cristiano Melo, 01 de Setembro de 2008

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Cirurgia Bucal


Mucosa úmida, contorna dentes experientes
Epitelial, conjuntivo, ósseo
Intervenção cirúrgica necessária
Dos tecidos a recuperar.

Química e física,
Principiam a arte em manuseio.
Biologia e fisiologia,
Norteiam a prática do artista.

Tic Tac, o relógio do tempo urge
Conversas descontraídas
Numa praia a ser desvendada
Ondas azuis e pérolas encontradas.

Cuidado e esmero no preparo
Do tesouro perolado,
Em colar transformado,
Curvo em arcada dentada.

Tic tac, o tempo repara
Os tecidos inflamados se restauram
Artista e colar de perolas sorriem,
É feita a mágica da confiança.

Cristiano Melo, 22 de maio de 2009.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Individuação

Parta o cordão,
Parta!

Fuja do Édipo inconsciente
Transforme seu umbigo.

Temer é garantido
Sofrer não.

Brincadeiras possíveis do macaco consciente...

Cristiano Melo, 21 de Maio de 2009.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Carrossel de ilusão

Homem adulto composto de alegrias
Tristezas, ilusões, delusões,
Passado, presente e futuro,
Um homem!

Fantasias de um presente seguro
De um carrossel tranquilo a girar
Com seus altos e baixos, ao futuro,
Passado que lhe leva ao mesmo lugar.

Conhecer o mundo, não deixar raízes
Buscar conhecimento, iluminar-se
Reconhecer fatídico seus matizes
Não se apazigua o ferir-se.

Estacas de pés na pueril consciência...

Pauladas de cinto na carne infantil...

Sorriso de dentes quebrados e corpo roxo...

Adulações humilhantes ao carrasco...

Sonhos transformados em pesadelo!

O telhado era o único refúgio,
E, talvez, nunca tenha decido dele,
Passado que congela o presente,
Futuro interrompido com escárnio.

Carrossel de fantasias ardis
De um mundo além-telhado
De uma vida estragada
Crisálida rompida por pura maldade.

Miséria emocional que atinge
Não só a criança, mas todos ao redor
Dificuldades em ser o homem que é
O mais é pura fantasia em carrossel.

Cristiano Melo, 18 de Maio de 2009.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Julgamentos injustos

Há justiça quando julgamos?
O juizo do alicerçado pensamento,
É justo?

Apontamos facilmente os culpados,
Rejeitamos tacitamente erros,
Justiça das próprias entranhas
Sem esperanças.

A sorte nos leva a caminhos de conhecimento,
Pre-julgamentos,
Pre-conceitos,
Concebidos à luz da razão.

O dedo em riste
Aponta o algoz.
Jamais, na conhecida capacidade de se vitimizar,
Dedar a si.

Numa lide,
Comuns desafetos ocorrem,
Juizos de valores escorrem,
Dor colide.

Explosões de sentimentos,
Julgamentos,
Não há justiça
Só carniça!

Sociedade que se constroi,
Que se julga juiz
Por ser vitima
Não doi.

Não em mim,
Em quem julga.
Só em ti,
Cadafalso a espera.

Como ser justos
Com juizos e julgamentos?
Não há como!

Talvez, ó sim, talvez!
As reticencias desta afirmação
Possam ser, pelo menos uma vez,
Postas a franca apreciação.

Não me serve,
Não te serve,
Não nos serve,
Só nos apodrece!

Sejamos justos sim,
Sem julgamentos,
Sem soberbos pensamentos.

Fantasias utopicas
De uma sociedade
Em transformação:
Justiça que vem do coração.


Cristiano Melo, 18 de Setembro de 2008.

sábado, 16 de maio de 2009

Infancia Interrompida


A dor de existir, de caminhar
Faz-te entupir o sangue de veneno
O pulmão com fumaça malhada
O olhar ao horizonte te consome.

Não te sentes segura, não é menina?
Teus pais te espancam os sonhos
Os vizinhos calam e não te salvam
Para onde fugir e do inferno escapar?

Na forca que te jogam esperar
O pescoço que pende eterno!
Julgada à revelia, de defesa furtada,
Sem sono quando a noite some.

Queres fugir, não é criança fina,
De teus medos e temores bisonhos?
Quem sabe viver em paz no afã
Do divã e poder, finalmente, amar.

Tenho medo por ti, menina do telhado,
Teu predador a espreita diligente,
E o que tentar do contrario é engolfado.

Queria te pegar no meu colo de gente.
No teu sono, inspirar sonho embalado
Da tua infancia extirpada por demente.

Cristiano Melo, 17 de Maio de 2009.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Da metrópole às origens: uma despedida!


Cara São Paulo,


É chegado o momento da despedida.

Agradeço por tudo: toda loucura, todo desespero, todo exagero, toda cultura.


Perdoe-me, mas não sou digna da tua solidão,

Das tuas distâncias,

Das tuas tempestades,

Do teu caos,

Da tua competição.


Minha querida São Paulo,


Meu amor por ti não é forte o bastante para superar o abandono,

O isolamento,

A acomodação,

O medo.


Quero ter liberdade para atravessar a cidade.

Quero sair de casa com mais certeza de que vou voltar com cuidado,

Com conforto, a passos largos e relaxados.
Quero ter colo, solo, mar e amar.

Quero brisa, quero céu azul, quero ar.

Querida São Paulo,

Despeço-me e me despedaço,

Pois tu és parte de mim, mas eu não consigo ser parte de ti.
Adeus amada, confusa, concreta, sonhada metrópole.


Nossa relação não será mais a mesma.

Será efêmera, ligeira, superficial, da forma como exiges.

Será distante, saudosa, inteira, divertida.


Conhecimento, cultura, amigos, amor, trabalho...

Tudo me destes e muito me tirastes.
Sabes muito bem ir da abundância à ausência.

Preenches e esvazias, como as tempestades,

E queres fazer de conta que nada aconteceu.

Pouco se transformastes nesse tempo,

Mas tanto me moldastes e me despertastes.

Contigo descobri o que realmente importa e me alimenta.


E por isso devo partir, pois o que tenho que conquistar não são tuas ruas repletas, teus prédios cinza, teus moradores de concreto, tuas relações restritas. Eu quero mais. Quero a mim mesma. E, apesar do teu tamanho, o meu eu não cabe em ti. É muito leve, colorido, intenso, saudável, verdadeiro e amoroso e não consegue se manifestar no teu ar poluído nem em tuas faces estressadas.

Mas não levo mágoas, não!

Levo paz de dever cumprido, pois que te enfrentei e cheguei ao topo.

Mas o topo é solitário, é frio, é ilusão.


Por isso te amo, porque tu és a minha verdade, o meu espelho, o meu lado sombrio, o meu topo.
E agora que já te conquistei, posso ir em paz. Vou em busca de desafios menos debilitantes, de braços abertos, de conversas à beira-mar.

Mas tu estarás sempre comigo.

Afinal o primeiro topo é inesquecível!


Por Helena Ximenes, Maio de 2009

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Prateleira


Devastado na prateleira de um açougue
A formação romântica distorce a realidade
Busca frenética pra aliviar a solidão
Exposto na boutique de carnes inválidas.

Não se pode ser feliz sem estar entregue
Não se vive solitário, pura vaidade
Sentimentos torpes que não passam pelo coração
E a bunda na janela pra mãos sórdidas.

Inadequado e assustado
Dir-se-ia alma penada

Hipócrita e desleixado
Falar-se-ia carne condenada

Escolhas diversas,
Inúmeras oportunidades,
Humano engarrafado
Pasteurizado na prateleira.

Romper com o marasmo aprendido
De se apaixonar para viver
Pois estar só é o mesmo que morto
Garantir-se-ia um lampejo de consciência.

Escolhido e encolhido
Feliz e fodido...

Ou se enxerga como ser que é,
Ou pereça como carne na prateleira
Coberta de moscas esfomeadas
E o romantismo não lhe salva a alma.

Seja,
Esteja,
Só.

O coração clama
Entregue-se a ele,
Pois ninguém lhe leva flores
Além de você mesmo!
Os românticos são estéreis de sentimento.

Cristiano Melo, 14 de Maio de 2009.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Constructo

O dia arrasta lento
Seu rosto em pensamento.
A noite leva ligeiro
Seu sorriso faceiro.

Se relativo é posto em voga o tempo,
Em real esboço trago a esperança
Que tamborilava ansiosa,
Antes de lhe ceder meu momento.

Toma banho,
Escorra água,
Limpa medo,
Enxuga pesadelo.

Com afeto entrego em mãos juntas,
Aquilo que considero sagrado
É, a meu modo, adequado
Que me coloco aparado de pontas.

Pele sensível,
Beijo tranquilo,
Olhos profundos,
Corpos unidos.

Venha então
O que se tem para vir...
Pois do tempo, temo não!
A vida que se pode construir.

Cristiano Melo, 30 de Setembro de 2008.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Maria Ninguém

Tua alegria mudou Maria Ninguém,
Por trás da membrana cinzenta de teus olhos,
Dos lábios de cor violácea, disformes,
E corpo emagrecido, com as salientes costelas.

A vida não te sorriu, Maria...
A sociedade te pariu e te desajuntou
Tua realidade é outra, das muitas fomes
A tua é sórdida com suave brilho de estrelas.

Para onde ir, não é Maria?
Aos braços de teu Zé Ninguém?
Para ele espancar tua alma com fórceps?
Enfiar pela tua goela a fumaça maldita?

Onde está o céu, deve ser uma questão,
Quase nunca ou sempre indagada em teu travesseiro.
Não é Maria? Mas mesmo a fome de teus filhos,
Não te aguçam a responder tais perguntas.

Está enferma Maria, muito doente!
E esta doença, é contagiosa e fatal.
Os ricos que te temem só sustentam teus males
E te deixam confusa com sorrisos de predador.

Shangrilá, Céu, Nirvana, Passárgada...
Paraísos fora de tua realidade, ó Maria,
Quais teus sonhos, tuas motivações?

Teu filho quer carinho, mas dá o pouco que tem
Ao Zé que te acorrenta e que devolve na mesma medida
As surras mútuas em teu mundo, Ninguém.

Tenho compaixão de ti e dos teus semelhantes,
Mesmo que tenha me sequestrado, furtado e espancado
Na minha alma maculado um furo.

Queria abraçá-la Maria, em meus braços te contar
Da vida que poderia ser diferente,
Dos sonhos que poderiam existir aos teus filhos.

Mas teu vício jocoso consome voraz
E só tem ouvidos aos Zes e Marias,
Nem a mim nem aos teus pequenos filhos,
Consegue ater-te em qualquer atenção.

Talvez por saber de teu destino:
Mais uma cova rasa!
Jazigo das Marias Ninguéns.

Cristiano Melo, 10 de Maio de 2009.

domingo, 10 de maio de 2009

Anunciada


Menina da praia de Iracema,
Cabelos dourados,
Olhos cor de caju
Sua beleza realça a alma dourada.

Menina que se fez mulher
Casou e teve filhos
Conviveu com a ditadura
Graduou-se em bioquímica.

Menina da bela Fortaleza
O sorriso fácil e farto
Alegra sua beleza.

Humana e solidária com extrato
Galgou filhos de toda natureza
Hoje é avó e mãe, mulher e tato.

Maria Anunciada Oliveira de Melo,
Este é o seu nome.
Também pode ser chamada
Menina dos olhos de mel.

Cristiano Melo, 10 de Maio de 2009.

sábado, 9 de maio de 2009

La Chica

Chica, ó menina de piercing na sobrancelha,
Tu és bela e de uma profunda nostalgia
Que escondes com o olhar sorridente.

Mas eu te vejo Chica,
Sim, te vejo, e entendo menina,
Que tu tiveste teus percalços e caíste.

Tu que tens o cabelo pintado, as unhas esmaltadas,
Tatuagens em tua alva pele, ó Chica,
Não percebes que te percebo?

Sim, te acompanho, mesmo quando desligas o telefone
Fugidia do mundo e do cotidiano.
Não te perturbes, por favor, me aceite.

Dá-me tua mão e ouvidos
Deixa que te mime um pouco
Durma em meus braços e suavize os vincos da testa.

Por um momento, Chica, que seja um segundo apenas,
Permita-me afagar teu ser iluminado
Que percebo em ti mais que em qualquer outro ser.

Aceita-me Chica, sim eu te vejo!

Cristiano Melo, 08 de maio de 2009.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Suavidade



Pega tua mão fina e afaga-te,
Coloca teu sorriso farto pra fora,
Arrepia os finos pelos de teu corpo,
Aguça, consciente, teus sentidos!

Existirá amor afinal em ti?!
Alma maculada ditosa em espera...
Poderá abrandar a dor do passado torto?
Casca humana de contos feridos...

Escola própria de si na suavidade
E no peso amargo de sentir
Com o tempo, nada a mais que idade.

Caminhar pelo estreito descalabro de sentir
Emergir são e vivo da vaidade
Na humana existência, sem temer o sorrir.

Cristiano Melo, 07 de Maio de 2009.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Tédio


Os ponteiros do relógio lhe açoitam
Qual condução sob vara ao carrasco
Furtivas idas a cozinha pra busca
De algo que não está lá, azulejos brancos...

Tic Tac! Zuumm! Pam Pam!
Martelam ora suave, ora tosco
Fortuitas entradas na alienante estaca
Sociedade fálica de tamancos...

Varar a noite, o dia, na sua solidão
Que é, talvez, a única verdade absoluta
Atrofiar do cérebro a percepção.

Quando do êxtase engolido resta
Sente o amargo gosto em expansão
Do tédio que lhe tem como visita!

Cristiano melo, 06 de Maio de 2009.

domingo, 3 de maio de 2009

Mapa da Violência no Brasil


Darei uma pausa na poesia para tratar de um tema que está muito em voga em nossa sociedade brasileira: a violência.


O Brasil é um dos países com o maior número absoluto de homicídios do mundo, ganha até de países em guerra ou que enfrentam ditaduras e, ainda países em extrema pobreza, onde se morre de fome.


Não é meu intuito adentrar muito na discussão teórica do que vem a ser violência, quais agentes envolvidos etc. Para isto, me utilizo do chamado “mapa da violência” de autoria de Julio Jacob Waiselfisz, elaborado, editado e distribuído pela Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura – OEI e tendo o apoio do Ministério da Saúde do Brasil com sua primeira edição datada de 2007. Assim, para os interessados em aprofundar-se na teoria e nos números apresentados recomendo ver o link disponibilizado abaixo:




Meu interesse com este texto é levantar algumas questões que ficaram em minha mente após ler o trabalho em si. Claro que como qualquer dado estatístico, deve-se analisar com um olhar crítico e inseri-lo no contexto em que a pesquisa foi realizada. Nesse sentido, não pude deixar de perceber que no “ranking” dos municípios mais violentos no país, não são encontrados aqueles que costumeiramente aparecem na grande mídia. O que me faz pensar de imediato em manipulação de informação e em como a nossa mídia se atem a fatos sensacionalistas que ocupam semanas e até anos sobre aquela notícia de um caso apenas, enquanto em municípios menores, a violência tem aumentado mais que nas grandes cidades, veja o texto de Julio Jacob, e a notícia que surge é de violências que podem ser “consumidas” pelo público, daí não se ter a devida proporção do que se acontece realmente no país.


O próprio trabalho “mapa da violência” não é objeto de interesse de divulgação da grande mídia, onde turistas, conferencistas, trabalhadores brasileiros e estrangeiros poderiam atentar sobre os dados do município brasileiro a ser visitado. Podendo facilitar, infelizmente, a sua entrada nas estatísticas do próximo levantamento.

É claro que a própria sociedade é responsável, sempre somos. Mas a divulgação das informações pertinentes encontra, a meu ver, um bloqueio criminoso, o da manipulação da informação e o do sensacionalismo para manter a audiência alta, aí entra a responsabilidade também da sociedade que consome estas notícias não de forma crítica, mas mais passivamente e não é comum que se questione, porque não se existem informações mais relevantes ao cidadão, para o seu próprio exercício de cidadania, salvo raríssimas exceções.


Bem, como a violência é um assunto que diz respeito a todos nós cidadãos brasileiros e do mundo, resolvi trazer este assunto com o texto para leitura, como maneira de divulgar algo importante para a sociedade.


Boa leitura e interpretação!

Cristiano Melo, Maio de 2009.

Fonte: Waiselfisz, J. J. .Mapa da violência dos municípios brasileiros. OEI, 1ª edição, Brasília, 2007.

Conversas Fiadas


Conversas desconexas, fiadas,
Falas frívolas, assoberbadas,
Sorrisos nervosos, complexo,
Barulhos e burburinhos sem nexo.

Aumento no cerne da ansiedade
Associado ao aumento do tom,
Tagarelices com amendoim sem piedade.
Garrafa de água marcada de batom.

As mãos suadas de algum:
Qualquer lampejo de razão?
Gargalhadas infames de cartum.

E a orquestra continua, desafinada sem noção.
Imbuída em seu propósito: nenhum!
Fim do ato introdutório, silêncio, apreensão...

Cristiano Melo, 01 de Novembro de 2008.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Amarga Humanidade


Zigotos inconscientes, moldes celulares
Umbilicóides débeis pós-parto, primeira morte
Massa disforme em modelação
Alienantes alienados, seres vivos mortos.

Morte
Nascimento
Morte
Nascimento
Morte

Viajantes famélicos de conhecimento
Urge a ponta escalada do buraco
Afogados em cova rasa
Nem dá pra escaldar
Só a guarda do coletivo esmagar.

Amargor causado sem louvor
Responsabilidade do atoleiro de bosta
Do cheiro diarréico do perfume francês.

Repugnante umbigo nas costas
Cavalgas em teu melhor amigo
Ludibrias e vampirizas
Vítimas da mesma estirpe
Mesma espécie.

Morre
Não nasça

Fútil esperança!

Cristiano Melo, 01 de Maio de 2009.
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