Cara São Paulo,
É chegado o momento da despedida.
Agradeço por tudo: toda loucura, todo desespero, todo exagero, toda cultura.
Perdoe-me, mas não sou digna da tua solidão,
Das tuas distâncias,
Das tuas tempestades,
Do teu caos,
Da tua competição.
Minha querida São Paulo,
Meu amor por ti não é forte o bastante para superar o abandono,
O isolamento,
A acomodação,
O medo.
Quero ter liberdade para atravessar a cidade.
Quero sair de casa com mais certeza de que vou voltar com cuidado,
Com conforto, a passos largos e relaxados.
Quero ter colo, solo, mar e amar.
Quero brisa, quero céu azul, quero ar.
Querida São Paulo,
Despeço-me e me despedaço,
Pois tu és parte de mim, mas eu não consigo ser parte de ti.
Adeus amada, confusa, concreta, sonhada metrópole.
Nossa relação não será mais a mesma.
Será efêmera, ligeira, superficial, da forma como exiges.
Será distante, saudosa, inteira, divertida.
Conhecimento, cultura, amigos, amor, trabalho...
Tudo me destes e muito me tirastes.
Sabes muito bem ir da abundância à ausência.
Preenches e esvazias, como as tempestades,
E queres fazer de conta que nada aconteceu.
Pouco se transformastes nesse tempo,
Mas tanto me moldastes e me despertastes.
Contigo descobri o que realmente importa e me alimenta.
E por isso devo partir, pois o que tenho que conquistar não são tuas ruas repletas, teus prédios cinza, teus moradores de concreto, tuas relações restritas. Eu quero mais. Quero a mim mesma. E, apesar do teu tamanho, o meu eu não cabe em ti. É muito leve, colorido, intenso, saudável, verdadeiro e amoroso e não consegue se manifestar no teu ar poluído nem em tuas faces estressadas.
Mas não levo mágoas, não!
Levo paz de dever cumprido, pois que te enfrentei e cheguei ao topo.
Mas o topo é solitário, é frio, é ilusão.
Por isso te amo, porque tu és a minha verdade, o meu espelho, o meu lado sombrio, o meu topo.
E agora que já te conquistei, posso ir em paz. Vou em busca de desafios menos debilitantes, de braços abertos, de conversas à beira-mar.
Mas tu estarás sempre comigo.
Afinal o primeiro topo é inesquecível!
Por Helena Ximenes, Maio de 2009